segunda-feira, 7 de janeiro de 2008

Amor em Tempos de Cólera

"Pedro Pacheco Pereira não gosta de chamar-se terapeuta, mas reúne pessoas, algumas delas casais, ou "partes" de casal, à volta de "um trabalho de consciência de si mesmo", explica. "Há uma demanda pela perfeição e pelo glamour, e expectativas de realização de vida mais exigentes, em especial, na cidade", contextualiza, "mas o problema é o olhar, o olharmos para a alma", diz, num tom sereno. "Vivemos numa era em que os valores são idealizados, mas não são vividos. Tem de haver um propósito comum entre duas pessoas para que não haja um vazio na busca da evolução." Um patamar de entendimento, como me disse um psicólogo uma vez, que deve existir em paralelo com o namoro. Amar é querer gerar, multiplicar. "Ao usarmos a energia sexual como está a ser usada, desorientamo-nos. A maioria não tem conhecimento da sua importância, usa-a apenas como uma busca pessoal de satisfação imediata e não como um combustível de elevação de consciência. Trabalhamos para o lado animal, por isso, o sexo é como um chuto para a veia, cria adição. Espera-se apenas que o outro cumpra as expectativas; se trouxer conflito, não o quero, não o Atendo."
Bauman escreve que «qualquer que seja a capacidade geradora de fusão que o sexo possa ter, ela vem da sua "camaradagem" com o amor», mas a forma como vivemos ambos parece querer dizer que, na verdade, não só nos tornámos mais egoístas, como mais desconfiados e cobardes: preferimos viver a prazo, e pela rama, do que dar o salto e talvez voar. A grande questão, afirma José Manuel Palma, é que "analisamos as relações num binómio custos/prémio e, depois, fazemos a comparação com as potenciais alternativas: se alguém tiver para oferecer uma melhor relação custos/prémio, eu tendo a mudar. Sempre foi assim, mas agora é mais assumido, por isso, mais comum".
O primeiro passo é "compreender o que é o amor e se a relação implica amor ou não. É que, muitas vezes, as pessoas separam-se porque o amor nunca foi construído", explica. "Ou porque não houve verdade nesse amor, porque temos todos muito medo de nos expor. E a maioria de nós vive em insegurança, em todas as nossas relações, é uma defesa instintiva. É o medo que mata o amor. O medo da rejeição", diz Pedro Pacheco Nobre, que pausa antes de continuar. "Se existir amor, não existe medo. O oposto do amor não é ódio, mas medo (da mesma forma que o que se opõe à verdade não é mentira, mas o orgulho e o que opõe à mentira não é a verdade, mas a consciência). Nós receamos ficar sozinhos, mas receamos dar-nos, porque queremos passar uma imagem de perfeição." Mas isto leva-nos a pensar que, na mesma sociedade onde o indivíduo procura sobressair da multidão, o pavor da solidão é reinante. "Nós não existimos sem outro."
Assim, o amor, hoje, amplia-se e procura ninho nos mais variados colos, nomeadamente no da amizade, que se aprofunda. Nunca tivemos tão bons amigos e, no caso feminino, tão bons amigos homens. Há uma geração, as mulheres casadas não saíam para divertir-se com outras mulheres, muito menos com homens que não fossem seus pretendentes oficiais. "É uma consequência dessa falta de casais estruturados", explica José Manuel Palma.
Pedro Pacheco Nobre acredita no potencial inesgotável de cada um para se "descobrir e curar". Porque o amor também se aprende. E treina-se. "Há quem nunca tenha sido ensinado a amar, a olhar para o outro, a tentar compreender o outro, a aceitar o outro sem o querer mudar. Todos procuramos um preenchimento quando não nos sabemos preencher a nós". Por isso, "se eu não praticar amor, paz, justiça, essas sementes não crescem. Precisam de ser regados. E não basta amar a pessoa em si, implica que eu saiba amar também as outras pessoas e as outras coisas, que lhes dê a minha atenção. O materialismo em que estamos a viver, mais tarde ou mais cedo, fracassará. Continuaremos a viver numa era de individualismo, mas em conjunto: cada um será cientista de si mesmo, mas sempre em comunicação com o outro." Temos de deixar de ver a família apenas na sua dimensão genética, mas pensarmos numa família universal. Fraternidade, Dádiva."

Patrícia Barnabé
In revista Vogue - Outubro 2007

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