quinta-feira, 19 de abril de 2007

Letras

"Vivemos as nossas vidas, fazemos seja o que for que fazemos e depois dormimos: é tão simples e tão normal como isso. Alguns atiram-se de janelas ou afogam-se, ou tormam comprimidos; um número maior morre por acidente, e a maioria, a imensa maioria é lentamente devorada por alguma doença ou, com muita sorte, pelo próprio tempo. Há apenas uma consolação: uma hora aqui ou ali em que as nossas vidas parecem, contra todas as probabilidades e expectativas, abrir-se de repente e dar-nos tudo quanto jamais imaginámos, embora todos, excepto as crianças (e talvez até elas), saibamos que a estas horas se seguirão inevitavelmente outras, muito mais negras e mais difícies.
Mesmo assim, adoramos a cidade, a manhã, mesmo assim desejamos, acima de tudo, mais."

Michael Cunningham
in As Horas - Editora Gradiva, 1999

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