terça-feira, 19 de agosto de 2008

Quase metade das espécies de primatas está em risco de extinção

"Um futuro sem primatas parece um quadro improvável, mas os dados mais recentes não nos deixam ser optimistas. Cerca de 48 por cento das 634 espécies e subespécies de primatas são considerados vulneráveis, em perigo ou ameaçados de extinção no último relatório da União Internacional para a Conservação da Natureza (IUCN), agora divulgado.
"É bastante espectacular, estamos a dizimar os primatas", diz Jean-Christophe Vie, um dos responsáveis do Programa de Espécies da UICN. As principais razões do declínio são simples: a perda do habitat e a caça.
A desflorestação do Sudeste Asiático, da África e da Amazónia reduz progressivamente as comunidades de primatas e põe em risco todas as espécies dessas regiões. Já a caça, tanto para alimentação de comunidades locais, como para a produção de medicamentos tradicionais, é uma ameaça direccionada que não acaba quando se criam zonas protegidas.
O relatório foi apresentado no XXII Congresso Internacional da Sociedade de Primatologia, em Edimburgo, e está a assustar os peritos da área. "Andámos preocupados durante anos com o estado dos primatas, mas agora temos informação consistente que mostra que é bem mais grave do que imaginámos", diz Russell Mittermeier, presidente da organização Conservação Internacional (IC).
O estudo foi feito nos últimos cinco anos e abarca todo o mundo. Apesar de nenhuma região dar uma perspectiva animadora, o que está acontecer na Ásia é particularmente negro. Setenta e um por cento das espécies estão em risco. No Camboja e no Vietname, mais de 85 por cento das espécies estão ameaçadas.
"A situação na Ásia é causada pela desflorestação feita para a agricultura", explicou por telefone ao PÚBLICO Mike Hoffmann, responsável pelo programa da Unidade de Biodiversidade da IC. Hoffmann, que é especialista em primatas, dá o exemplo de parques naturais no Vietname que têm tido sucesso em reproduzir espécies em cativeiro que já quase não se encontram na natureza. "Mas não se pode reintroduzir se não houver protecção nem habitat", explica.
Proteger o habitat
Como é que se pode combater o problema? Apesar de cada local ter que ser avaliado por si, Hoffmann diz que há medidas gerais que podem ser aplicadas. "A forma de conservação principal tem que ser a protecção do habitat." Que serve para os primatas, mas também para as outras espécies. E esta protecção tem que envolver os governos e as comunidades locais. Noutras situações, em que por exemplo é a alimentação que está em causa, a solução não pode ser a mesma. "Em África, a carne de animais selvagens é mais fácil de obter do que a de galinha", explica Hoffmann. Uma das soluções é as pessoas alimentarem-se de peixe, outra é aumentar o custo da carne dos primatas. Ambas as medidas são inverosímeis sem uma explicação que passa pelo contacto directo com as comunidades.
Exemplos a seguir
Em África e na América a situação não é tão grave. Mesmo assim, só em Madagáscar, cerca de 43 por cento das 92 espécies estão em perigo. A ilha alberga lémures, um grupo de primatas que evoluiu independentemente e não existe em mais lado nenhum. Várias regiões têm muitas espécies em zonas localizadas. "Se perdermos uma área de floresta, perdemos muitas espécies", explica o primatólogo.
Outras espécies estão ameaçadas individualmente e necessitam de medidas de protecção direccionadas, como os gorilas. Nos últimos anos, o número de gorilas aumentou e considera-se passar a espécie de ameaçada de extinção para vulnerável.
No Brasil há outros bons exemplos. Duas espécies de saguis têm sido alvo de conservação nas últimas três décadas. Depois de uma primeira tentativa de reintrodução falhada, a reflorestação localizada e a protecção fez os animais subirem na lista vermelha da IUCN. São um testemunho que contraria o pessimismo e a confirmação de que é possível inverter a tendência."

Nicolau Ferreira (06.08.2008)
In site
Ecosfera

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