Quem tem tarifa bi-horária paga mais em hora de ponta do que com tarifa simples
"Meio milhão de consumidores domésticos de electricidade em Portugal, correspondentes aos contratos de tarifa bi-horária e a 11 por cento do consumo nacional, entraram num ano inédito. Pela primeira vez desde a introdução desta modalidade tarifária, quem tem este tipo de contrato paga mais pelo consumo nas horas de ponta, chamadas fora de vazio, do que quem tem tarifa simples.
A diferença é bem visível: em 2008, o preço do kwh na tarifa simples era 0,96 por cento mais cara do que a bi-horária em hora de ponta, este ano é 1,8 por cento mais barata. O consumo em horas de vazio da tarifa bi-horária continua a ser mais barato do que em tarifa simples, este ano 45,2 por cento menos.Depois de quase uma década habituados a que a tarifa bi-horária fosse sempre mais barata do que a simples em qualquer período horário, a ERSE confirma a mudança, justificando: há vários anos que a regulação da electricidade começou a fazer o caminho nesse sentido, defendendo que "não era aceitável que o preço da energia fora de vazio fosse inferior à tarifa simples", disse fonte oficial.
A entidade reguladora sustenta que o processo tem sido transmitido ao mercado de cada vez que há mudanças nas tarifas, o que acontece todos os anos, mas, tratando-se de um detalhe tarifário, admite que tem circulado também de forma bastante mais discreta do que a restante informação. Agora, o processo tornou-se visível, com a alteração de "forças" entre as duas tarifas, com a entidade a dizer que visa também proteger quem consome menos, com o peso do custo fixo na factura em decréscimo. A olhar para o rebalanceamento tarifário como um "petroleiro que muda de rumo, lenta e consistentemente", a ERSE garante que "a trajectória é para continuar" até que o preço da tarifa simples fique a meio dos dois preços da bi-horária, considerando ser essa a "relação correcta".
Em causa está fundamentalmente o entendimento da ERSE de que o sistema "tem de ser mais justo e reflectir os custos da cadeia de valor associada à energia eléctrica", desde o preço da energia ao uso das infra-estruturas das redes, por exemplo. Uma consequência desta ideia é que a potência contratada, o que tradicionalmente se designa por "contador", tem de deixar de ser diferente entre escalões iguais e entre tarifas bi-horárias e simples, porque os aparelhos são os mesmos para um caso e para outro e os custos de contagem também são iguais. O que tem de ser tarifado de forma ainda mais diferenciada é o preço da energia que, em um caso e outro, o consumidor paga, acrescenta a mesma fonte, declarando ao PÚBLICO que "isto é fazer aderir a tarifa aos custos, o que tem sido feito racionalmente".
De 2008 para 2009, o preço da potência contratada baixou para todos os consumidores, mas especialmente para os da tarifa bi-horária, que pagam menos 6,4 a 6,7 por cento, contra uma descida mais ligeira de 1,6 por cento para os da tarifa simples. Ao mesmo tempo, a distância de preço do "contador" de uns e de outros reduziu-se 18 por cento.
A potência contratada caminha, assim, para ter um valor mais baixo do que o actual e igual entre os mesmos escalões - com os consumidores de tarifa simples a terem descidas mais ligeiras do que os do bi-horário -, enquanto o preço da energia tende a ter maiores aumentos e crescente diferenciação. A ERSE não antecipa quanto tempo demorará até chegar ao objectivo, adiantando apenas que "tem de ser gradual".
A tarifa bi-horária, como a recente tri-horária, foram criadas (esta última em 2009) para incentivar ao consumo mais racional de electricidade. Quem consome fora das horas de ponta do sistema eléctrico (horas de vazio), solicitando a produção de centrais eléctricas menos caras, é beneficiado com tarifas bastante inferiores ao regime simples e o contrário passa a ser também cada vez mais verdade. Ou seja, quem acende a luz em casa nas horas de maior consumo (fora do vazio) é penalizado porque está a contribuir para a entrada em serviço das centrais que custam mais caro ao sistema.
Ao fim de quase uma década, Portugal tem 560 mil consumidores em tarifa bi-horária e 4,5 milhões ainda em tarifa simples. A factura eléctrica anual dos primeiros - para um consumo médio de 700 horas e englobando a potência contratada e a energia consumida -, estimada pelo PÚBLICO, subiu este ano em média entre 3,49 e 4,55 por cento, consoante os escalões, enquanto para os segundos anda entre 4,39 e 4,52 por cento. As tarifas para 2009 anunciadas pela ERSE previam um aumento entre 4,3 e 4,8 por cento para os consumidores de baixa tensão normal e especial."
Lurdes Ferreira (19.05.2009)
In site Público - Economia
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