Fernando Pessoa. Faz hoje 75 anos que perdemos o maior poeta português
Não vamos convidá-lo a brindar com absinto. Mas ler um poema ou dois é uma boa forma de recordar o génio que morreu há 75 anos. Pode também ir ao Teatro São Carlos, em Lisboa, ver o "Filme do Desassossego" (21h). Mas primeiro celebremos um poeta que fez nascer muitos mais. Pessoa e alguns heterónimos para degustar
Fernando Pessoa
Mini B.I.
Nasceu a 13 de Junho de 1888 em Lisboa. Ainda na infância, teve o primeiro amigo imaginário ou pseudónimo: Chevalier de Pas. Ainda se inscreveu na Faculdade de Letras, mas desistiu e começou a trabalhar como tradutor e correspondente estrangeiro em casas comerciais. Só publicou um livro em vida: "Mensagem". Morreu de cirrose hepática aos 47 anos.
Personalidade
"Era tímido, fechado, mas com uma personalidade de liderança. Muito generoso e tinha um lado de brincalhão, que vemos nas cartas a Ofélia [namorada]", diz o investigador de Fernando Pessoa, Antonio Cordiello.
Poema
"O poeta é um fingidor.
Finge tão completamente
Que chega a fingir que é dor
A dor que deveras sente."
Um bom tema de conversa
Se encontrasse Fernando Pessoa na rua, podia pedir-lhe indicações sobre o melhor absinto de Lisboa, o ambiente no Martinho da Arcada ou que livro comprar. Pessoa era um leitor voraz. Conselhos para escrever cartas de amor, é melhor dispensar. Vai acabar com um poema carregado de diminutivos, ao estilo "almofadinha".
Álvaro de Campos: o engenheiro
Mini B.I.
"Álvaro de Campos nasceu em Tavira, no dia 15 de Outubro de 1890", explicava o próprio Fernando Pessoa em carta a Adolfo Casais Monteiro. Depois de uma educação banal, foi para Glasgow, na Escócia, estudar engenharia naval. Numas férias no Oriente, descobre o opiário e torna-se, digamos, fã da substância. Mais tarde veio Lisboa, onde estava em "inactividade". Morre no mesmo ano que Fernando Pessoa.
Personalidade
"Excêntrico, provocador até mesmo brincalhão. Passou pela febre do modernismo, o fascínio pelo oriente e por último uma fase de grande pessimismo", explica ao i Antonio Cardiello.
Poema
"Não sou nada.
Nunca serei nada.
Não posso querer ser nada.
À parte isso, tenho em mim todos os sonhos do mundo."
Um bom tema de conversa
Se Álvaro de Campos fosse vivo, ia adorar falar de iPads, Kindles e outras tecnologias de ponta. O engenheiro era um modernista fascinado por máquinas. Falar sobre a sua última viagem ao oriente também seria um bom desbloqueador de conversa.
Alberto Caeiro: viver no campo
Mini B.I.
Um homem do campo que escrevia por inspiração. Fernando Pessoa descreveu-o como o "mestre" que apareceu nele. "Alberto Caeiro nasceu em 1889 e morreu em 1915; era de Lisboa, mas viveu quase toda a sua vida no campo. Não teve profissão nem educação quase alguma. Morreu turberculoso em 1915", escreveu o poeta.
Personalidade
"É um homem simples, equilibrado, de inspiração pré-socrática. Representa o homem inserido na natureza", diz Antonio Cardiello. O heterónimo fundamental do paganismo. É um homem dos sentidos, um poeta da natureza que defendia que "pensar é estar doente dos olhos".
Poema
"Eu nunca guardei rebanhos,
Mas é como se os guardasse.
Minha alma é como um pastor,
Conhece o vento e o sol
E anda pela mão das Estações
A seguir e a olhar"
Um bom tema de conversa
Falar do último turismo rural que abriu no Alentejo era um óptimo começo. Se visitou algum país com reservas biológicas, tipo Galapagos ou Costa Rica, também é bem jogado. Conversas mais complexas e elaboradas é que nem por isso.
Ricardo Reis: o médico
Mini B.I.
"Ricardo Reis nasceu em 1887 (não me lembro do dia e mês, mas tenho-os algures), no Porto, é médico e está presentemente no Brasil", explicava Fernando Pessoa numa carta de 1935. Estudou num colégio de Jesuítas e deixou o país porque era um monárquico convicto. Morreu, segundo José Saramago, em 1936.
Personalidade
É um homem que aceita o destino. E não é preciso dizer mais. "É de um estoicismo... Enfrenta a vida e vive o instante, o momento concreto. É um aristocrata, um pouco bucólico", diz Antonio Cardiello.
Poema
"Cada um cumpre o destino que lhe cumpre,
E deseja o destino que deseja;
Nem cumpre o que deseja,
Nem deseja o que cumpre."
Um bom tema de conversa
Não lhe peça conselhos de medicina mesmo que lhe doa as costas. Os médicos também gostam de falar de outras coisas. Neste caso poderia puxar o tema da monarquia ou melhor: o sentido da vida. Garantimos que ia ter uma discussão estoicista bem interessante.
Vanda Marques (30 de Novembro 2010)
In jornal I
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