Longevidade. O casamento prolonga a vida dos homens
Estudo inédito defende que o trabalho não lhe está a roubar anos de vida e que a fé numa religião prolonga a vida das mulheres. Os investigadores destacam ainda o papel das relações sociais na longevidade de cada um
O casamento será sinónimo de uma vida longa? Sim, se for homem. Ser religioso pode ajudar? Sim, se for mulher. Investigadores da Universidade da Califórnia garantem ter chegado a novas pistas para ter uma vida longa e prometem destruir alguns mitos. Para isso, a equipa seguiu a vida de 1528 pessoas, inscritas num estudo científico quando tinham cerca de dez anos, em 1921, pelo psicólogo Louis Terman da Universidade de Stanford. Os conselhos podem não garantir uma entrada directa no clube dos centenários, mas relativizam alguns dilemas actuais: uma profissão absorvente, por exemplo, não é na opinião destes especialistas um mau prenúncio. Este e outros resultados foram publicados este mês no livro "The Longevity Project: Surprising Discoveries for Health and Long Life from the Landmark Eight-Decade Study" (14,5 dólares na Amazon). Leslie R. Martin, co-autora do trabalho, explicou ao i que nunca é tarde para se começar algumas mudanças no dia-a-dia.
A corrida aos segredos da longevidade não parece estar perto da meta, tendo em conta os sucessivos trabalhos inconclusivos - dos genes certos aos comprimidos mágicos (recorde-se a euforia em torno do resveratrol e da rapamicina), passando pelas apologias do exercício físico, da medicina alternativa ou do treino cerebral. O facto é que a melhoria do acesso a cuidados de saúde tem feito a sua parte, mesmo debaixo da nuvem de novas epidemias como a obesidade ou a diabetes.
Segundo as previsões mundiais, a nova geração - como chamou o "The Huffington Post" à cada vez mais populosa faixa etária acima dos 80 - deverá aumentar 233% até 2040, um crescimento sete vezes superior ao previsto para a população em geral.
"Quando começámos", explicam os autores no comunicado que lança o livro, "era claro que algumas pessoas eram mais propensas à doença, demoravam mais a recuperar, ou morriam mais cedo, enquanto outras da mesma idade conseguiam sobreviver. Foram propostas todo o tipo de explicações - ansiedade, pouco exercício, carreiras stressantes, tendência para correr riscos, pessimismo - mas nenhuma tinha sido estudada durante um grande período".
Duas décadas depois, e com registos dos últimos 90 anos, fizeram esse estudo. O follow up da amostra de Terman, previsto para seis meses, acabou por dar pano para mangas: os jovens participantes atravessaram as fases das suas vidas e não foram os mais optimistas a viver mais tempo, nem os que tinham os melhores hábitos. Entre eles estavam, por exemplo, a repórter de guerra Shelley Mydans [1915-2002] ou Norris Bradbury, um dos homens por trás do armamento nuclear norte-americano [1909-1997]. Uma das descobertas mais surpreendentes do estudo foi perceber que as suas personalidades em criança poderiam prever o risco de mortalidade décadas depois, diz Leslie R. Martin. As crianças consideradas mais alegres e bem-humoradas pelos pais e professores "tiveram vidas mais curtas" do que as companheiras mais reservadas e prudentes. Adoptar como máxima pessoal o relaxado "vai correr tudo bem" parece ser prejudicial. Entre os que começaram a escola mais cedo, antes dos seis anos, descobriram também uma longevidade reduzida.
Outra surpresa, destaca a investigadora, foi a diferença encontrada entre homens e mulheres para o impacto do casamento. "Depois de um divórcio, para os homens é melhor voltar a casar enquanto para a mulher não importa." Homens casados vivem para lá dos 70 e menos de um terço dos divorciados apresenta uma probabilidade forte de viver tanto, adiantam. A esta sina escapam apenas os homens que nunca casaram. Já entre as mulheres, quer nunca casem, quer casem, fiquem sozinhas depois do divórcio ou voltem a casar, o nível de longevidade é o mesmo.
Ligue-se Uma das precursores mais consistentes de uma vida longa parece ser a existência de laços interpessoais, de entreajuda. Leslie R. Martin explica que não se trata de começar a procurar amigos novos, ou de obrigar os mais tímidos a sair da casca, mas de haver um esforço para cultivar relações, muitas ou poucas, ou apenas as familiares. Já a entrega ao trabalho - pasmem-se os críticos aos workaholics - não parece ser motivo para grandes receios. Os investigadores descobriram que as pessoas mais comprometidas vivem mais tempo e que o stresse e as preocupações não roubam, na prática, anos de vida.
O livro reúne ainda conclusões sobre o papel da fé e o impacto da guerra na esperança de vida, publicadas nos últimos dois anos. Os investigadores descobriram que as mulheres com crenças religiosas vivem mais, um fenómeno que não se verifica nos homens.
Aos leitores prometem quizes para avaliarem até quando vão viver com base nos seus comportamentos e personalidade, para saberem o que podem mudar. Leslie R. Martin duvida que alguma vez surja uma prescrição universal para a vida longa, mesmo que deposite as suas convicções nesta. "Muitas das coisas em que as pessoas pensam, como preocuparem-se com o rácio de ómega 3 nos alimentos que comem, acabam por ser distracções dos caminhos principais", conclui.
Marta F. Reis (24.03.2011)
in Jornal I
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