O plano tarifário EDP/Continente teve 40 mil adesões numa semana, atraindo quem julga que vai pagar menos. O Esquerda.net fez as contas e verificou que a campanha é enganadora, pretende atrair clientes para o mercado liberalizado, e ainda obriga ao abandono das tarifas bi-horárias e a aceitar o débito direto.
A EDP e a Continente celebraram uma parceria que permite aos clientes da primeira obter um desconto de 10% sobre a fatura de eletricidade (antes de impostos), que será creditado no cartão Continente e poderá ser gasto em compras. O negócio é criticável desde logo porque discrimina negativamente quem não faz compras no Continente, nomeadamente quem prefere o comércio de proximidade por motivos sociais e ambientais, e assim contribui para que a empresa retalhista do grupo SONAE tenha uma maior quota de mercado. Mas, pior que isso, a campanha publicitária é enganadora.
Desde 2006 que existem duas tarifas para clientes da EDP: a regulada e a liberalizada. Com o fim de atrair clientes para o mercado liberalizado, a EDP oferece agora uma tarifa mais baixa. Concretamente, a EDP pratica uma tarifa de 0,1393€/kwh no mercado regulado e uma tarifa de 0,1299€/kwh no mercado liberalizado (plano “EDP Casa”, atualmente disponível para potências superiores a 6,9 kVA). Quem aderir ao mercado liberalizado com base no plano “EDP Continente”, contudo, terá de pagar a tarifa correspondente ao do mercado regulado, superior à tarifa mais baixa do mercado liberalizado em aproximadamente 7,24%.
Em compensação, quem aderir ao plano “EDP Continente” terá de pagar um pouco menos pela potência contratada (o “aluguer do contador”) que quem aderir ao plano “EDP Casa”, uma diferença que oscila entre os 1,7% e os 1,8%.
Façamos então as contas. Suponhamos que temos uma habitação com uma potência contratada de 6,9 kVA e um consumo de 300 kwh. A título ilustrativo, apresento abaixo as simulações de três faturas com diferentes planos tarifários, não incluindo a contribuição audio-visual, que é igual nos três.
Comparado com o tarifário regulado, aparentemente ambos os tarifários do mercado liberalizado apresentam vantagens. Mas a vantagem do plano “EDP Continente” é medida não em dinheiro vivo mas num crédito que apenas pode ser gasto no Continente, o que faz toda a diferença.
Comparando os dois tarifários do mercado liberalizado, contudo, a vantagem é menos evidente. Depois de deduzido o desconto no cartão Continente (o que suporia tratar este desconto como dinheiro vivo) teríamos um valor mais baixo em €1.95 com o plano “EDP Continente”. Antes da aplicação do desconto, contudo, este plano sai mais caro que o plano “EDP Casa” em €3.25.
Ou seja, o desconto que a EDP oferece a quem mude para o plano “EDP Continente” é com base numa fatura mais elevada que a dada a quem adere ao mercado liberalizado com outro plano. O rebuçado dado aos portugueses para mudarem para o mercado liberalizado não é, portanto, tão doce quanto a publicidade anuncia.
Note-se, no entanto, que, como referido anteriormente, o plano “EDP Casa” apenas está disponível para quem tem uma potência contratada acima de 6,9 kVA. Quem tem uma potência inferior terá de escolher entre a tarifa regulada e a do plano “EDP Continente”, o que torna a segunda aparentemente muito mais atrativa. Mas há outras desvantagens ainda para quem adere ao mercado liberalizado.
Quem mudar da tarifa regulada para o plano “EDP Continente” perderá o acesso às tarifas bi-horária e tri-horária. Quanto ao método de pagamento, apenas poderá escolher o débito direto, não podendo pagar via Payshop ou Multibanco nem podendo escolher a opção “conta certa”. Acresce que a vantagem do plano “EDP Continente” é temporária, já que os descontos no Continente deixam de ser oferecidos a partir do final deste ano.
O objetivo da EDP com este plano é incentivar a transição de clientes do mercado regulado para o mercado liberalizado, sabendo-se desde já que o mercado regulado desaparecerá em 2013. Ou seja, temos um ano de campanha descarada ao Continente seguido da liberalização completa dos preços da eletricidade, que permitirá à EDP aumentar as tarifas à medida das exigências dos acionistas. Ganha a EDP, ganha o Continente, perdemos nós.
Ricardo Coelho
in Esquerda.Net
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