quarta-feira, 16 de maio de 2007

Arquitectura Ferroviária em Portugal

"Não foi apenas na capital que uma série de arquitectos marcantes deixaram o seu nome ligado ao projecto de estações de caminho-de-ferro.
Aqui se evocam os casos mais significativos, numa viagem virtual entre Tomar, Vila Real de Santo António e Porto.

Basta pensar na Grand Central Station de Nova Iorque, cenário de incontáveis filmes, para concluir que uma estação ferroviária, para além de ser funcional pode, também, ser bonita. E ter um valor arquitectónico significativo.
No caso português, quem viaje frequentemente pelas nossas linhas constatará que, muitas vezes, o desenho de estações, armazéns, torres de sinalização, dormitórios, etc, obedeceu a algum cuidado, seguiu padrões de qualidade que ainda hoje nos impressionam e reflecte a evolução dos gostos e estilos. Alguns exemplos ao acaso: a elegante estação de Valença, cuja fachada virada à vila não ficaria mal num «boulevard» parisiense; a imponente estação de Mirandela, belo exemplo de construção tardo-oitocentista; algumas das estações da antiga Linha do Vale do Vouga, completamente «francesas» nas suas formas, decalcadas das suas congéneres das linhas secundárias da pátria de Voltaire. Em muitos casos a presença de azulejos é uma mais-valia significativa e confere às nossas estações um aspecto inconfundível. No caso de edifícios mais «funcionais» evoquem-se as arrojadas torres de sinalização e manobra de estações como Rossio, Campolide ou Pinhal Novo.
De Tomar a Vila Real
Uma série de estações projectadas por Cottinelli Telmo, durante as décadas em que foi arquitecto da CP, ilustram o processo, nada linear, através do qual se foi evoluindo dos padrões clássicos e nacionalistas para o modernismo. Inaugurada em 1931, a pequena estação do Carregado (hoje difícil de apreciar devido às obras em curso neste troço da Linha do Norte) é uma espécie de versão abreviada da do Sul e Sueste: de novo a definição do vestíbulo como espaço dominante da estação e, no exterior, a substituição do tradicional alpendre em ferro por uma pala em betão, suportada por elegantes pilares. Feita três anos depois, a estação da Azambuja (hoje muito alterada pela sua transformação em estação final dos suburbanos da Grande Lisboa no seu percurso para Norte) era muito menos arrojada, tanto nas suas linhas exteriores, como na estrutura interna, onde o átrio perdia a sua função primordial. Ainda mais incongruente, a estação de Tomar, praticamente contemporânea destas três (1928), parece desenhada por um arquitecto totalmente diferente, imperando um estilo pesado, cinzento e historicista.
Mas novamente a faceta modernista vem ao de cima, com a estação de Vila Real de Santo António, términus da Linha do Algarve (1936). Aqui se alia à veia modernista uma releitura da arquitectura regional: o edifício desagrega-se numa série de volumes geométricos elementares, todos cobertos por terraços à maneira das casas tradicionais. O cais é protegido por uma generosa pala em betão e as paredes respectivas cobertas a azulejos azuis lisos. No interior volta-se à solução do grande átrio multifuncional e dominante.
Torres Futuristas
Claramente modernas e ainda hoje com um desenho que não parece ultrapassado são as torres de sinalização e manobra que foram sendo introduzidas, à medida que as agulhas passavam a ser comandadas electricamente e surgiam os primeiros sistemas automáticos de sinalização. Entre 1935 e 1940, Cottinelli Telmo projectou várias para estações como Rossio, Campolide, Pinhal Novo ou Ermesinde.
Já que se falou de Ermesinde, é hora de tomar a direcção do Porto, pela Linha do Norte. Pelo caminho, um olhar atento distinguirá que o tom dominante das estações que atraem o olhar é tudo menos modernista, com o estilo meio «português suave», meio regionalista, a marcar Vila Franca, Santarém ou Aveiro. Já a maior parte das coberturas dos cais são em ferro, suportadas por pilares do mesmo material. Uma das únicas excepções marcantes é a pequena estação da Curia, último projecto de Cottinelli Telmo para a CP (1944). Um telhado imponente como que agrega todos os diferentes volumes num só corpo. O átrio continua a ser o espaço de referência, ainda que não colocado ao centro do alçado. Cá fora, a cobrir o cais, nem alpendres de ferro nem palas de betão: um pórtico apoiado em pilares de pedra.
Porto: Regresso à tradição
A chegada ao Porto (estamos a falar da quase centenária estação de São Bento) é a oportunidade para o reencontro com um estilo bem mais tradicional. A estação, construída entre 1901 e 1915, segue um desenho clássico de inspiração francesa, ou não tivesse o seu autor, Marques da Silva (1869-1947), estudado e trabalhado em Paris. Com obra marcante no Norte, projectou, entre muitos outros edifícios, o vizinho Teatro de São João. Os alpendres interiores da gare, a caminho do túnel que liga a Campanhã, são um magnífico exemplo de arquitectura do ferro. E, quanto a decoração, o átrio é dominado pelos esplendorosos painéis de azulejo da autoria de Jorge Colaço (1922), retratando episódios da História de Portugal, cenas regionais, a evolução dos meios de transporte, etc. Uns, os de cariz histórico, seguem a tradicional coloração a azul e branco, enquanto os referentes à evolução dos meios de transporte, ainda que de menores dimensões, têm já uma completa panóplia de cores. Estes painéis – que tornaram esta estação internacionalmente famosa – viriam a sofrer um importante restauro já nas décadas de 80 e 90."

In site: http://www.cp.pt

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