O alho tem tudo para ser considerado um alimento com elevada capacidade medicinal e, em boa verdade, sempre o foi. Desde suplemento alimentar com vista a aumentar a força de escravos egípcios para a construção das pirâmides e atletas greco-romanos em eventos desportivos, até à cura de lepra, asma, varíola, picadas de escorpião, para tudo o alho serviu como medicação chegando ao ponto de ter sido utilizado em tempos como moeda, tão elevada era a sua valorização. Existe mesmo o mito de que Hipócrates, o pai da medicina, teria um repertório de mais de 300 remédios que incluíam alho para além de canela e alecrim.
E a nossa gastronomia proporciona-nos uma grande familiarização com este legume quer nas excepcionalmente típicas açordas e marinadas ou com a feliz trilogia de alho, azeite e tomate. Embora as quantidades em que é consumido não façam dele um alimento a ter em conta para a satisfação das necessidades de algum nutrimento, o alho é particularmente rico em vitamina C, B6, cálcio, cobre e selénio.
Aquilo de que menos gostamos no alho é justamente a fonte de todas as suas virtudes. A alicina, um composto organossulfurado, tanto nos oferece aquele indistinguível hálito, como aporta o seu grande potencial de prevenção de doença. Embora não se possa dizer categoricamente que a ingestão de alho reduz o risco de cancro, a verdade é que essa é uma forte probabilidade, sobretudo quando falamos do cancro da próstata, esófago, ovário e cancro colo-rectal. As suas propriedades antibacterianas e antivirais consubstanciam o seu uso ancestral como “desinfectante” sendo igualmente interessantes os seus efeitos moderados no que à diminuição da pressão arterial, colesterol (total e LDL) e triglicerídeos diz respeito.
Todos estes benefícios esbarram muitas vezes no modo como o alho é consumido, que tanto os pode potenciar como os pode eliminar. Em Portugal, o refogado ou estrugido é quase sempre o ponto de partida para muito do que cozinha. Não sendo consensual que o alho faça parte desta “instituição” lusa, o certo é que as altas temperaturas atingidas (às quais o azeite é também submetido) destroem muitos dos seus compostos organossulfurados. Por outro lado, o seu consumo em cru (principalmente esmagado ou picado), a sua adição a marinadas, açordas e legumes salteados ou até esfregado em pão com azeite resultando num pão de alho caseiro, serão formas de consumo mais apelativas ao paladar e à saúde.
Assim, de hoje em diante, tente encarar o hálito a alho não como um obstáculo social mas sim como um sinónimo de saúde.
Pedro Carvalho, nutricionista (pedrocarvalho@fcna.up.pt)
in Lifestyle Público
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